quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

Fechô no Gueto - Carolzinha

Carol, Pequena em estatura, porem grande em expressão poética, nesse texto ela traz o mais lindo movimento de nossas periferias, "o calor humano"!

Fechô no Gueto

"Pois é, as rezas deram certo. Não tinha nenhuma nuvem no céu, e de vez em quando até tinha fogo. A molecada não arredou o pé, podecrê, e a festa foi daquelas bonitas demais. É certo que foi meio sem jeito, aos trancos lá em cimão do barranco, a Kombi subia zuada. Mas o calor tava bravo machucando o lombo de quem brincava com insistência. Fizemos o improviso, no terreirão enlaçado de fitas coloridas. Enchemos a barriga de abrigo. O presente era cada par de olhinhos, cada um sabendo a lonjura da própria perna. Tinham muitos pares desses olhinhos, muitas vontades, novelos de linha enroscando nesse trecho de mundo calorento chamado Taboão. Os olhinhos fincavam, meio fechados por causa de tanta claridade. O pó sobe, a pipa sobe. Que nada, 37º? Muito mais! Um paredão de casas, morro, morro e sol. A mulherada ardia no meio do fumacê pra cima e pra baixo, gritando. Os donos dos olhinhos, ao contrário, faziam a farra. Não tem tempo ruim, porque não tem tempo perdido. Afinal, cada um é dono da sua própria artimanha. Na manha, a torneira gira, o povo aproxega. O povo gira, no meio do aguaceiro. Tudo brilhou naquele canto do Gueto: as bexigas, as Flores, as cercas, as malocas, a Vila toda. E o dia sem fim ainda iniciando, fazia a reverência pros nossos tataravós ao contrário".

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